Ferrugem da soja: histórico, manejo e atualização

Foto da ferrugem da soja

O histórico de aparecimento, os métodos atuais de controle e a atualização do status da incidência na safra 23/24 da doença mais importante da cultura da soja.

A ferrugem asiática da soja é uma doença que assusta produtores e preocupa pesquisadores ao redor do mundo. No Brasil, essa realidade não é diferente, principalmente por ser a doença mais importante na cultura agrícola mais plantada no país.

A doença, que chegou ao Brasil há mais de duas décadas, causa muitos estragos, apesar dos avanços nos métodos de controle, do melhoramento genético, do monitoramento e previsão de incidência e do manejo agrícola.

De rápida expansão e difícil controle, a ferrugem asiática da soja causa diversos danos aos produtores que buscam sempre métodos mais eficientes para seu controle. Essa preocupação se dá principalmente pelo fato do potencial de quebra de produção da doença.

Nesse artigo falaremos sobre o histórico da ferrugem, suas causas e sintomas, os danos causados e os métodos atuais de controle. Também traremos um panorama atual da safra 2023/24.

Histórico da ferrugem da soja

A ferrugem da soja foi diagnosticada e identificada pela primeira vez em 1902, no Japão. E foram apenas 120 após esse primeiro caso identificado que ela chegou no Brasil. Antes disso, a ferrugem foi identificada em outros países asiáticos e na Austrália na década de 30, na Índia na década de 50 e no Havaí somente em 1994.

Na África chegou em 1996 e se espalhou pelo continente. Já na América do Sul, surgiu no ano de 2001 no Paraguai, chegando ao Brasil, provavelmente do país vizinho, na região norte e oeste do estado do Paraná. No ano seguinte chegou à Argentina e dois anos mais tarde aos EUA.

Mapa com o histórico da identificação de ocorrência da ferrugem asiática

Histórico da identificação de ocorrência da ferrugem asiática (Fonte: EMBRAPA)

No Brasil, após sua entrada em 2001, em 3 safras, a ferrugem já aparecia em 80% das áreas produtoras de soja no país. A expansão para o MS, MT, GO, MG, SP, SC e RS aconteceu logo nas primeiras safras. A última fronteira para a expansão da soja nas áreas de plantio foi Roraima que teve casos detectados apenas em 2021.

Expansão da ferrugem da soja nas 2 primeiras safras após identificação (Fonte: Fitossanidade Tropical)

O que causa e quais os principais sintomas da ferrugem da soja?

A ferrugem da soja é causada por um agente patogênico fúngico, o Phakopsora pachyrhizi. Esse fungo é um microparasita obrigatório, ou seja, que precisa de hospedeiros para finalizar seu ciclo e manter sua sobrevivência.

Ele pode infestar mais de 150 espécies de plantas, mas no Brasil, as principais são a soja e o trigo, como culturas agrícolas. As principais fontes de inóculos são plantas de soja “tiguera” que germinam das sementes que caem no solo no momento da colheita.

A ferrugem se expande rapidamente e a longas distâncias pela alta produção de esporos e sua fácil dispersão pelo vento. Além disso, as condições climáticas tropicais brasileiras favorecem o ciclo do fungo. O P. pachyrhizi tem alto potencial de infecção em situações de molhamento foliar entre 6 e 12 horas e temperaturas entre 15 e 28 oC.

As condições de alta umidade pós chuva e temperaturas altas, muito comumente vistas nas regiões produtoras de soja no Brasil, são bastante favoráveis à disseminação e infecção pelo fungo. Já as safras mais secas, com estiagem, normalmente têm menor incidência da doença.

Os principais sintomas da ferrugem da soja são:

  • Na fase adaxial (superior) de folhas infectadas, pontos de coloração escura;
  • Na fase abaxial (inferior) de folhas infectadas, pontos de coloração castanha e formação de pústulas, onde se desenvolvem os esporos que serão dispersos e causarão novas infecções;
  • Amarelecimento e queda de folhas, iniciando pelo terço inferior (baixeiro) e evoluindo para o terço médio e superior.

Folhas de planta de soja com sintoma de ferrugem asiática (Fonte: ESALQ)

Danos agronômicos, produtivos e econômicos da ferrugem da soja

Em termos agronômicos, a ferrugem da soja causa danos pela redução da área foliar fotossinteticamente ativa, o que diminui a assimilação de carbono e o acúmulo de biomassa. Isso se reflete no crescimento e desenvolvimento de plantas, além de limitar a fase de enchimento de grãos.

Do ponto de vista produtivo, a ferrugem pode causar perdas de potencial produtivo no campo, entre 10 e 90% da produção. Isso pode acarretar perdas de R$ 6.000,00 por ha, com uma previsão produtiva de 65 sacas/ha e preço de venda de R$ 120,00 por saca.

Além disso, há também os custos mais altos de aplicação de defensivos para controle da ferrugem da soja, o que também diminui o percentual de lucro. Mesmo assim, é importante ressaltar que é muito mais rentável investir em um manejo correto para evitar os danos da ferrugem do que poupar no manejo e perder grande parte da produção.

Métodos de controle da ferrugem da soja

Existem métodos e técnicas agrícolas que auxiliam na prevenção e/ou controle da ferrugem da soja. Uma combinação de métodos preventivos e curativos pode gerar bons resultados, propiciando um manejo integrado da doença.

Abaixo citamos métodos importantes a serem usados pelos produtores no campo:

  • Sistema de plantio direto: a presença de palhada dificulta a disseminação da doença por evitar a infecção por esporos que estejam no solo;
  • Vazio sanitário e rotação de culturas: respeitar o tempo de vazio sanitário da cultura e certificar do bom controle de plantas de soja tiguera após a colheita da safra, evitando hospedeiros que sejam fonte de inóculos. A rotação de culturas faz o mesmo papel, diminuindo os inóculos da doença;
  • Semeadura: as lavouras semeadas mais tarde tendem a ter maior pressão da doença em períodos de definição da produtividade. Semear mais cedo, pode diminuir a infestação da doença e seus impactos;
  • Escolha da cultivar: uso de genótipos com maior tolerância à ferrugem da soja;
  • Controle químico, biológico e indutores de resistência: o uso de moléculas fungicidas de efeito comprovado contra o fungo causador da ferrugem deve ser feito. Dentre os químicos, os triazóis, estrobilurinas e carboxamidas (sítio-específicos) e multisítios são recomendados. Dentre os biológicos, destacam-se os produtos à base de Bacillus. Há também um crescimento do uso de indutores de resistência para uso combinado com o controle químico e/ou biológico;
  • Manejo correto: é importante respeitar as recomendações de aplicação de produtos para controle de ferrugem. O uso de doses corretas, intervalos entre aplicações e número de aplicações é primordial para evitar a aquisição de resistência, por exemplo.
  • Monitoramento do clima e infestação: conhecer e monitorar o clima, bem como mapear a incidência da ferrugem na região são técnicas preventivas bastante interessantes. Essas informações podem ser cruciais para a decisão da utilização de aplicações preventivas à infestação do fungo. Hoje em dia existem muitas ferramentas digitais que auxiliam nesse monitoramento.
Ciclo de infecção e manejo proposto para a ferrugem da soja

Ciclo de infecção e manejo proposto para a ferrugem da soja (Fonte: EMBRAPA)

O uso de práticas de manejo integrado de doenças é importante para evitar ou retardar a aquisição de resistência do fungo aos fungicidas. Essa resistência tem aumentado grandemente nos últimos anos, tanto na diminuição da porcentagem de controle da doença como no tempo para aquisição de resistência.

Situação atual da safra 2023/24 da soja

Atualmente a situação da ocorrência de ferrugem da soja é mapeada pela iniciativa do Consórcio Antiferrugem, uma iniciativa público-privada que se dedica ao combate da ferrugem da soja.

Na safra atual houve um crescimento do surgimento da doença, principalmente na região Sul, logo nos meses iniciais da safra. Isso provavelmente esteve relacionado a um inverno menos rigoroso que permitiu a brotação de soja tiguera e uma maior pressão inicial da doença.

Atualmente, na safra 2023/24, já existem 279 registros de ferrugem asiática na soja (até o dia 14/02/2024) nos seguintes estados: PR (124), RS (89), MS (35), SP (12), SC (7), MG (6), GO (3), BA (1), MT (1) e RO (1).

A predominância da identificação da doença tem se dado no estádio R5, ou enchimento de grão da soja. O potencial de dano nesse estádio é alto por diminuir a área foliar e limitar a assimilação de carbono durante o enchimento de grãos, diminuindo a biomassa realocada para a vagem e, consequentemente, a produtividade da lavoura.

Mapa de ocorrência da ferrugem da soja no Brasil na safra 2023/24 (Fonte: Consórcio Antiferrugem)

Conclusão

O controle da ferrugem da soja tem sido um dos maiores desafios ao produtor rural brasileiro. Apesar dos avanços em sistemas de monitoramento, pesquisa e técnicas de manejo, é sempre difícil manter as lavouras livres da doença.

Métodos de manejo integrado, principalmente de maneira preventiva, têm mostrado efeito, mas é necessário um monitoramento constante de casos na região e das variáveis climáticas.

O uso racional de fungicidas químicos e biológicos é extremamente importante para evitar super ou sub-dosagem, diminuindo riscos de resistência do fungo frente às moléculas usadas. Por isso, o responsável técnico pela recomendação através do receituário agronômico deve ser muito cuidadoso.

O AgroReceita tem ferramentas que auxiliam os responsáveis técnicos e aumentam a eficiência da prescrição e uso de agroquímicos e produtos biológicos para controle da ferrugem da soja.

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Sobre o Autor

João Paulo Pennacchi

João Paulo Pennacchi

Engenheiro Agrônomo pela Universidade Federal de Lavras e Doutor em Fisiologia de Plantas pela Lancaster University.

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