Defensivos agrícolas no manejo de doenças da cultura da soja: tudo sobre o manejo com fungicidas!
Sumário
A soja possui inúmeros usos, desde a utilização para extração de óleo para indústria alimentícia, produção de biodiesel até a alimentação animal e humana (RIGO, 2015).
Na safra 2021/2022, o Brasil obteve uma produção de soja superior a 146 milhões de toneladas, em uma área de cultivo de aproximadamente 45 milhões de hectares distribuídas por praticamente todos os estados do país, sendo as regiões Centro-Oeste e Sul as principais produtoras desse grão (CONAB, 2024).
A grande diversidade de ambientes de produção ao longo do território brasileiro expõe a cultura da soja a uma série de condições climatológicas diferentes, incluindo diferentes patógenos causadores de doenças (GODOY et al., 2015).
Entre os principais problemas enfrentados pelas plantas da soja está o grande número de doenças que afetam a cultura, principalmente os fungos, que podem causar danos de até 100% nas lavouras (ZAMBOLIN et al., 2000). Com o aumento da área cultivada com soja e cultivares mais produtivas, ocorreu o aumento na incidência de doenças na cultura (SINCLAIR e HARTMAN, 2008).
Outro fator que contribui para o aumento da incidência de doenças está a monocultura da soja e a sucessão de cultivos da cultura (WAGNER, 2010).
Defensivos agrícolas na soja: uma visão das principais doenças
Entre as principais doenças da cultura da soja, incluem-se a ferrugem asiática (Phakopsora pachyrhizi Syd. & P. Syd.), antracnose [(Colletotrichum dematium var. truncata (Schwein.) Arx] e a míldio [Peronospora manshurica (Naumov) Syd.].
Além delas, também há uma série de doenças causadoras de manchas foliares que são mais conhecidas como doenças de final de ciclo, onde se encontram a septoriose (Septoria glycines Hemmi), cercosporiose (Cercospora sojina Hara) e a mancha alvo (Corynespora cassiicola Berk. & M.A. Curtis) (ITO, 2013).
Com base nisso, é essencial buscar informações sobre defensivos agrícolas no manejo de doenças na cultura da soja visando aprimorar os sistemas produtivos. Assim, o propósito deste estudo é fornecer insights sobre o uso de fungicidas sistêmicos e protetores na cultura da soja. Aproveite a leitura!
Histórico de fungicidas em soja
O grupo das estrobilurinas surgiu em 1993 com o pesquisador da República checa, Vladimir Musilék. O evento ocorreu ao verificar efeito fúngico em composto produzido em madeira apodrecida pelo fungo do grupo dos basidiomicetos Strobilurus tenacellus (REIS et al., 2007), seguido do surgimento dos triazóis na década de 1980.
Em 2004, ocorreu um aumento de fungicidas registrados no Brasil para o controle da ferrugem asiática, incluindo um maior número de produtos comerciais com associação de triazóis e estrobilurinas (UGALDE, 2005).
A partir de 2011, surgiram as carboxamidas, benzovindiflupir, fluxapiroxade e bixafenol, com o objetivo de aumentar as opções de modos de ação. Isso foi seguido do registro do mancozebe, no ano de 2014, em resposta à preocupação com as ocorrências de casos de resistência a moléculas já existentes no mercado (REIS; REIS, 2015).
Já no início de 2017, 63 fungicidas que possuíam registro para o controle de ferrugem asiática em soja foram suspensos pelo Ministério da Agricultura do Brasil. O motivo foi a baixa eficiência de controle, sendo a grande maioria deles com apenas um triazol ou uma estrobilurina.
Nas figuras 1 e 2 abaixo, estão apresentados os percentuais da classificação e dos grupos químicos dos principais fungicidas utilizados na cultura da soja, conforme a mobilidade nas plantas.
Figura 1. Classificação dos principais fungicidas utilizados na cultura da soja, conforme a mobilidade nas plantas.
Figura 2: Grupos químicos e as principais associações presentes em fungicidas na cultura da soja. Carboxamida (Ca), Oxicloreto de cobre (Ox. C), Triazol (Tr), Estrobilurina (Es), Mancozebe (Man), Morfolina (Mor) e Clorotalonil (Clor).
Sistêmicos
Os fungicidas sistêmicos possuem a capacidade de penetrar nos tecidos das plantas e serem translocados para atuar tanto na região atingida pelas gotas como em regiões onde não houve deposição de gotas com o princípio ativo. Conforme a figura 1, os fungicidas sistêmicos correspondem a 48% dos fungicidas registrados na cultura da soja.
Benzimidazóis
No grupo dos benzimidazóis, os principais princípios ativos utilizados em soja são o tiofanato metílico, carbendazim e principalmente as carboxamidas que foram muito utilizadas nos últimos anos. Porém, devido ao amplo espectro de controle e uso de forma incorreta, ocorreu um aumento considerável de espécies fúngicas resistentes.
Sua atuação fúngica ocorre pela inibição da divisão celular dos fungos, interrompendo o ciclo da mitose na fase da metáfase, interferindo no crescimento do tubo germinativo (ROBERTS & HUTSON, 1999) e na inibição da enzima succinato desidrogenase, interferindo também na respiração mitocondrial (FRAC, 2010).
Triazóis
O grupo dos triazóis é o que compreende o maior número de compostos e, o mais importante, é subdividido em diferentes moléculas que variam com relação ao controle de doenças e a sistematicidade nas plantas, controlando um amplo espectro de doenças.
Eles atuam nos fungos inibindo a biossíntese de esteróis, afetando a formação do ergosterol. O ergosterol tem grande importância para os fungos, pois é constituinte da membrana das células fúngicas. Então, sem sua presença, ocorre a interrupção do crescimento do micélio e o colapso da célula dos fungos.
Além disso, atuam também sobre a germinação dos esporos, podendo ser definidos como protetores ou curativos (EHR & KEMMITT, 2002).
As principais doenças foliares controladas na cultura da soja pelos triazóis são a ferrugem asiática, crestamento foliar, mancha parda e oídio, não tendo efeito em fungos que não sintetizam o ergosterol como Phytophthora e Pythium (BERGAMIN FILHO et al., 1995).
Entre os principais princípios ativos dos triazóis utilizados em controle de doenças foliares em soja estão o propiconazol, cyproconazole, flutriafol, tetraconazol, tebuconazol, epoxiconazol e miclobutanil (REIS et al., 2007).
Em formulação única, correspondem a 17% dos fungicidas registrados para a cultura da soja. Em associação com estrobilurinas, correspondem a 22%, sendo utilizados também em misturas com outros grupos químicos como mancozebe e carboxamidas (Figura 2).
Estrobilurinas
As estrobilurinas não são sistêmicas, mas sim mesostêmicas, o que significa que não podem ser translocadas para regiões muito distantes do local de deposição das gotas. Sua ação é translaminar, podendo, quando aplicada na parte adaxial da folha, ser translocada para a parte abaxial dela.
Elas possuem amplo espectro de ação, controlando diversos fungos causadores de doenças em plantas e com maior efeito residual devido a sua absorção pelas folhas de forma gradual e constante (VENANCIO et al., 2004).
A atuação das estrobilurinas nas células fúngicas ocorre pela inibição da respiração mitocondrial através do bloqueio da transferência de elétrons no complexo citocromo-bc1. O sítio de ligação das moléculas de estrobilurinas ocorre na oxiredutase ubi hidroquinona-citocromo-c. Sendo assim, não permitem a ligação do oxigênio.
Com a inibição da respiração mitocondrial, ocorre a interferência na produção de ATP pelos fungos, levando-os à morte (GHINI, 2006). No grupo químico das estrobilurinas, os principais ingredientes ativos são a azoxistrobina, piraclostrobina, cresoxim-metílico, trifloxistrobina e a picoxistrobina (REIS et al., 2007).
Morfolinas
O grupo das morfolinas é um tipo de defensivo agrícola recente com utilização para doenças foliares em soja, principalmente para a ferrugem asiática. Também possui atuação sistêmica nas plantas, podendo ser translocado para diferentes partes da planta.
Esse grupo atua na colonização dos fungos nos tecidos da planta, agindo sobre a síntese de ergosterol do fungo e afetando a formação das membranas celulares dele – porém, em enzimas diferentes em relação aos triazóis.
Atualmente, existe apenas um princípio ativo deste grupo para o controle da ferrugem asiática em soja, que é o fenpropimorfe.
Não sistêmicos (protetores)
Os “não sistêmicos” são fungicidas que interferem em muitos processos metabólicos nas células fúngicas. Dentre esses processos, podemos citar a interferência em atividades de várias enzimas, principalmente as que contém grupos sulfídricos, desorganizando várias funções na célula dos fungos (ZAMBOLIM, 2008), com amplo espectro de ação.
O clorotalonil atua também na inativação de várias enzimas, interferindo na produção de ATP e na permeabilidade de membranas fúngicas (BALARDIN, 2017).
Quando aplicados sobre a superfície das folhas, eles formam uma camada protetora na superfície delas com ação tóxica aos fungos. Não possuem capacidade de penetrar nos tecidos vegetais e, dessa forma, permanecem imóveis na planta.
Na planta, a ação deste grupo químico de fungicidas ocorre no momento da germinação dos esporos na superfície foliar vegetal. Quando ocorre o contato do tubo germinativo do fungo com o produto presente nas folhas, ele é absorvido e sua ação tóxica causa a morte do protoplasma. Dessa forma, inibe a germinação dos esporos e a penetração nos tecidos.
Neste grupo, são encontrados os ditiocarbamatos, principalmente o mancozeb, os cúpricos onde está o oxicloreto de cobre e o clorotalonil. Produtos à base desses princípios ativos e sua associação com triazóis e estrobilurinas têm sido usados de forma muito frequente nos últimos anos pela sua eficiência no controle de doenças e no manejo de resistência.
Importância do correto manejo de defensivos agrícolas na soja
O agronegócio é um mercado dinâmico, onde a busca pelo conhecimento é a chave para o sucesso. Na cultura da soja, dominar o manejo de defensivos agrícolas é uma habilidade indispensável para enfrentar os desafios que surgem a cada safra.
Agora imagine tomar decisões sem ter acesso às técnicas mais eficazes e atuais?
Isso pode resultar em perdas significativas, impactando diretamente a produtividade. Um estudo de 2023, conduzido pela Syngenta em parceria com outras renomadas instituições, revelou que o manejo inadequado das doenças na soja pode representar um prejuízo de até 40% na produção.
Nesse cenário de desafios, é fundamental estar atualizado com as melhores práticas do agronegócio para se destacar. E não há forma mais rápida e eficiente de fazer isso do que através de treinamentos com o apoio de mentores especialistas.
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Conclusão
A manutenção de altos tetos produtivos na cultura da soja é influenciada por diversos fatores bióticos e abióticos. Contudo, o controle de doenças é de suma importância, uma vez que estas podem acarretar grandes danos e perdas na produção de grãos e sementes de soja, resultando na necessidade do uso de fungicidas.
Entre as estratégias de manejo de fungicidas que demonstram melhores respostas no controle de doenças – especialmente a ferrugem asiática –, estão aquelas que empregam produtos com combinações de fungicidas de ação multissítio e sítio específico, envolvendo triazóis, estrobilurinas e carboxamidas.
É fundamental utilizar produtos com diferentes mecanismos de ação em associação com fungicidas multissítio durante as várias aplicações ao longo da cultura.
Além disso, também é útil alterná-los para reduzir os riscos de desenvolvimento de resistência por parte dos fungos aos fungicidas disponíveis no mercado, ao mesmo tempo que se mantêm tecnologias com eficácia comprovada.
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Referências
CONAB, Companhia Nacional de Abastecimento. Acompanhamento da safra brasileira – grãos – safra 2023/24 6° levantamento. Documento online. Disponível em: <https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/graos/boletim-da-safra-de-graos>. Acesso em: 13 de março de 2024. 2024.
GODOY, C.V. et al. Eficiência de fungicidas para o controle da ferrugem-asiática da soja, Phakopsora pachyrhizi, na safra 2014/15: resultados sumarizados dos ensaios cooperativos. Londrina: EMBRAPA Soja, 2015. 6p. (EMBRAPA Soja. Circular Técnica 111).
ITO, M.F. Principais doenças da cultura da soja e manejo integrado. Nucleus, v.10, n.3, 2013.
JULIATTI, F.C.; BELOTTI, I.F.; JULIATTI, B.C.M. Mancozeb associado a triazóis e estrobilurinas no manejo da ferrugem da soja. In: Reunião de Pesquisa de Soja, 34, 2014, Londrina. Resumos. Londrina: Embrapa, 2014. p. 253-254.
MCGRATH, M.T. What are fungicides? The Plant Health Instructor. 2004. DOI: 10.1094/ PHI-I-2004-0825-01
Sobre o Autor
Tiago Pedó
Doutor pelo PPGC&T de Sementes, nas áreas de fisiologia da produção, do estresse e de sementes de plantas de lavoura. Também é professor da Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel da Universidade Federal de Pelotas, além de participante e desenvolvedor de projetos de pesquisa.
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