Benefícios da Tecnologia Bt

Plantação de soja

O evento de transgenia que alterou os rumos da agricultura mundial, abriu horizontes para o menor uso de inseticidas e hoje é ferramenta em favor da sustentabilidade.

Produzir alimentos, fibras e combustíveis é o principal objetivo da agricultura ao redor do mundo. Atingir esse objetivo de maneira ambientalmente responsável, obtendo lucro e sendo socialmente justo é o que chamamos de sustentabilidade agrícola.

Um dos maiores desafios à essa sustentabilidade agrícola é o uso de produtos agroquímicos, principalmente no que diz respeito ao retorno do investimento do produtor. O controle químico responde por uma grande parte dos custos de produção e pode pender a balança desfavoravelmente em termos de lucratividade.

Assim, tecnologias que auxiliem na diminuição do uso de agroquímicos, sem, contudo, impactar nos níveis de controle de fatores bióticos, têm potencial para serem de alto impacto na agricultura atual.

Esse é o principal apelo do uso da tecnologia Bt na agricultura, desde seu surgimento até os dias atuais e futuros. Devido à sua importância, preparamos esse artigo para aumentar o entendimento dos representantes técnicos no campo quanto ao seu uso, características técnicas e principais benefícios.

Histórico da tecnologia Bt

O nome Bt vem do nome do bacilo Bacillus thuringensis, que é o microrganismo base dessa tecnologia. Abaixo mostramos a linha do tempo, da descoberta à popularização do uso dessa tecnologia:

  • 1901: a bactéria é descrita no Japão, pelo bacteriologista Ishiwara, e identificada como causadora da morte de larvas de bicho-da-seda;
  • 1911: a mesma bactéria é isolada na Alemanha, pelo cientista Berliner, é nomeada de B. thuringiensis e identificada como atuante no controle de larvas da traça da farinha;
  • 1915: o mesmo Berliner notou a presença de inclusões cristalinas nessas bactérias;
  • 1936: era lançado na França o primeiro inseticida à base do B. thuringiensis, tecnologia que se espalhou por outros países europeus nas décadas seguintes;
  • 1953: o cientista Hannay sugeriu que a capacidade patogênica da bactéria poderia estar relacionada aos cristais anteriormente identificados por Berliner;
  • 1968: o cientista Angus confirmou a hipótese levantada por Hannay;
  • 1985: detecção do primeiro caso de resistência ao Bt, em laboratório;
  • 1987: iniciou-se o processo da inclusão do evento Bt em plantas, para fim de controle de insetos. A primeira espécie relatada com tal modificação foi o fumo, porém com lançamento apenas em 1996;
  • 1990: detecção do primeiro caso de resistência ao Bt, em campo, no Havaí, com vários relatos nos anos seguintes em outras partes do mundo;
  • 1996: lançamento do primeiro milho Bt nos Estados Unidos;
  • 2005: introdução do primeiro algodão Bt no Brasil
  • 2007: introdução do primeiro milho Bt no Brasil;
  • 2010: introdução da primeira soja Bt no Brasil;
  • 2017: introdução da primeira cana Bt no Brasil.

Como funciona a tecnologia Bt

O efeito patogênico do Bt para insetos é baseado na formação de proteínas tóxicas que causam suas mortes. Normalmente essas proteínas são liberadas durante a esporulação da bactéria, mas outras podem estar presentes durante a fase vegetativa. Todavia, seu efeito acontece no trato digestivo, quando em contato com o suco gástrico básico dos insetos.

São diversos os tipos de proteínas originadas a partir do B. thuringiensis, sendo codificadas por genes específicos. Cada tipo de proteína pode ter modos de ação diferentes, além de poderem ter controle específico sobre diferentes espécies de insetos.

Dentre os grupos de proteínas, podemos citar as α-exotoxinas, β-exotoxinas, hemolisinas, enterotoxinas, quitinases e fosfolipases. Porém, as mais importantes são listadas abaixo:

  • Cry (Crystal): endotoxinas em forma de cristais, liberadas na fase reprodutiva (esporulação);
  • Cyt (Cytosolic): endotoxinas citosólicas, liberadas na fase reprodutiva (esporulação);
  • VIP (vegetative inseticidal protein): proteínas inseticidas liberadas na fase vegetativa da bactéria.
Estrutura do Bacillus thuringiensis

Estrutura do Bacillus thuringiensis (Fonte: A Cientista Agrícola)

Esse efeito patogênico do Bt para insetos é explorado em culturas agrícolas por meio da transgenia. Os genes que codificam as proteínas citadas acima são inseridos no genoma da cultura. Dessa forma, as proteínas são formadas em folhas, sendo que quando o inseto se alimenta das folhas ele ingere a proteína, e acaba morrendo quando esta chega a seu trato digestivo.

Importância e principais benefícios da tecnologia Bt

A principal importância do uso da tecnologia Bt está no controle efetivo de insetos sem o uso de agroquímicos. Isso acarreta uma série de benefícios do uso dessa tecnologia. Listamos alguns desses benefícios abaixo:

  • Diminuição do uso de inseticidas químicos: do ponto de vista ambiental, a diminuição do uso de inseticidas químicos já é um ponto forte, pois evita uso excessivo e desregrado, evitando possíveis contaminações ao meio-ambiente e a morte de insetos benéficos;
  • Controle de insetos: hoje em dia a tecnologia Bt apresenta um elevado nível de espécies de insetos que podem ser controlados. Isso abrange grande parte das pragas de importância para culturas como soja, milho, cana e algodão. Ao controlar insetos, aumenta-se a qualidade e produtividade da lavoura;
  • Diminui custos: sementes com a tecnologia Bt tendem a ser mais caras, porém, garantem proteção contra vários insetos ao longo do ciclo. Além disso, ao utilizar a tecnologia Bt, há menor necessidade de gastos com os processos de pulverização, gastos energéticos e os com os agroquímicos;
  • Segurança aos operadores: a diminuição do uso de produtos químicos diminui a exposição dos operados a moléculas com potencial de danos à saúde, sendo menos nocivos;
  • Sustentabilidade e produtividade: a tecnologia Bt promove aumento da produtividade em combinação com menores gastos e riscos ao ambiente e pessoal envolvido em operações agrícolas. Isso leva a um aumento da sustentabilidade do agronegócio.

Alguns genes da toxina BT são utilizados para o desenvolvimento de plantas resistentes a determinadas pragas, reduzindo o uso dos defensivos químicos. 

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Principais pragas controladas pela tecnologia Bt

Como citado acima, há uma gama de espécies que são controladas pela tecnologia Bt. Abaixo citamos as pragas de maior importância econômica em cada cultura, que tem potencial controle pelo Bt.

  • Algodão: lagarta curuquerê (Alabama argilácea), lagarta elasmo (Elasmopalpus lignosellus), lagarta rosca (Agrotis ípsilon), lagarta spodoptera (Spodoptera frugiperda), falsa medideira (Chrysodeixis includens, Rachiplusia nu e Trichlaplusia ni), lagarta das maças (Heliothis virescens, Helicoverpa zea, Helicoverpa amigera), falsa rosada (Pectinophara gossypiella) e falsa spodoptera (Spodoptera eridania, Spodoptera cosmioides);
  • Milho: lagarta do cartucho (Spodoptera frugiperda), lagarta rosca (Agrotis ípsilon), lagarta elasmo (Elasmopalpus lignosellus), lagarta do trigo (Pseudatelia sequax), lagarta da espiga (Helicoverpa zea, Helicoverpa amigera), broca do colmo (Diatrea saccharalis), lagarta spodoptera (Spodoptera eridania, Spodoptera cosmioides), larva alfinete (Diabrotica speciosa);
  • Soja: lagarta da soja (Anticarsia gemmatalis), falsa medideira (Chrysodeixis includens e Rachiplusia nu), lagarta elasmo (Elasmopalpus lignosellus), broca dos ponteiros (Crocidoserna aparerna), lagarta das vagens (Heliothis virescens, Helicoverpa zea, Helicoverpa amigera);
  • Cana: broca da cana (Diatraea saccharalis).
Cigarra na plantação

Cigarra na plantação (Fonte: Canva)

Resistência de insetos a tecnologia Bt e a importância do refúgio

O uso de plantas Bt por diversas gerações e em monocultivo pode gerar uma rápida adaptação de insetos e a aquisição da chamada “resistência ao Bt”. Isso ocorre pois o ciclo de vida dos insetos é bastante curto, e sua exposição constante às toxinas fazem com que elas rapidamente se adaptem, de geração a geração, aos efeitos nocivos das proteínas.

O aumento de insetos resistentes tende a fazer crescer exponencialmente o ganho de resistência dentro da mesma espécie, fazendo com que o efeito do Bt seja anulado para a espécie em questão. Isso pode trazer prejuízos enormes à sustentabilidade agrícola.

Felizmente, a técnica do refúgio agrícola é uma ferramenta que tem se mostrado bastante eficiente para evitar o ganho de resistência de insetos frente à tecnologia Bt.

Essa técnica consiste na manutenção de uma área de plantas convencionais em conjunto com as plantas transgênicas, permitindo a manutenção de insetos susceptíveis às toxinas provenientes do Bt e evitando que a resistência seja geneticamente transmitida.

Conclusão

A tecnologia Bt é uma ferramenta de suma importância para a agricultura moderna sustentável e seu uso tem crescido grandemente na agricultura brasileira. Trata-se de uma técnica segura e de grande alcance na proteção de cultivos agrícolas

Suas vantagens estão relacionadas ao menor uso de inseticidas químicos, aos menores custos de produção e à maior segurança pessoal e ambiental.

Porém, é necessário que sejam estabelecidas regras de uso de plantas transgênicas, visando evitar a resistência de insetos e a diminuição de seus efeitos.

Sobre o Autor

João Paulo Pennacchi

João Paulo Pennacchi

Engenheiro Agrônomo pela Universidade Federal de Lavras e Doutor em Fisiologia de Plantas pela Lancaster University.

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